quinta-feira, 15 de abril de 2010

[pessoas]

Há as que viajam e não vêem. Seus passeios são idênticos aos cartões postais, suas diversões seguem a risca os conselhos dos guias turísticos. Trancadas nos seus mundinhos não conseguem reparar o que deve ser reparado. Até porque o que deve ser reparado sempre está em algum esconderijo, nunca amostra. Coincidentemente e infelizmente elas agem da mesma forma quando vêm na nossa casa. Só admiram o que está cansado de ser admirado, enxergam o que está bem ao alcance dos seus olhos, só falam o que está sempre sendo falado. Só perguntam o que já respondemos um milhão de vezes. Só se preocupam com o que não tem importância e não entendem nem palavras inteiras.


Têm as pessoas que insistem em amar quem não as ama. São do tipo sempre tristes, sempre de mal com a vida, sempre se violentando, sempre cometendo torturas e sacrifícios. Não cansam de repetir que o universo conspira contra elas. Como se o universo tivesse tempo para perder com essas picuinhas. Como se o universo estivesse aí para perseguir alguém.

Pessoas que se machucam demais com seu real totalmente ilusório, seus amores que nunca chegam, seus sonhos inalcançáveis. Também acabam machucando os outros graças ao seu mau humor, sua coisa de que nada vai dar certo, seu ciúmes cheio de dor de cotovelo, sua cara sempre de gavetas fechadas.

Graças a Deus, a vida não se resume apenas a estética dos que não vão ao banheiro na casa dos outros, aqueles que nunca deixam passar um errinho de português sem que advirtam o pecador, dos que em qualquer assunto e sobre qualquer coisa, mesmo se tratando do futuro, eles já sabiam o que aconteceria ou já tinham uma opinião formada repleta de postulados e axiomas. Graças a Deus este lugar onde nos encontramos não se resume só aqueles que quando damos até logo eles prolongam o assunto ou dos que volta e meia estão roubando um minuto do nosso tempo.

Há o melhor tipo de pessoas. Aquelas que são bonitas. Sejam elas negras, amarelas ou brancas. Sejam elas com olhos puxados, azuis, castanhos ou cada um de cada cor. Sejam elas bem despertas ou ainda sonâmbulas. Sejam aquelas que vivem da pesca, da academia, estejam de cabelo raspado, trancinha, brinco ou passando protetor solar fator 50. As pessoas bonitas: sem distinção de pátria, sexo ou crédulo.

Engana-se em pensar que pessoas bonitas é uma raridade, na verdade ganham em número, gênero e grau das pessoas feias. O problema é que nos acostumamos a fazer notícia do que é feio e acabamos deixando para lá o que é agradável. Pessoa bonita faz dia de chuva radiante, faz elevador trancado virar dia do amigo, faz batida de carro acabar em pizza, faz pavor se transformar em romance. Pessoa bonita nunca está doente e quando está assim mesmo continua bonita, é uma doença do corpo e não da alma. Quando pessoa bonita derrama lágrimas, então todo mundo pára. Quando pessoa bonita chora é porque o mundo está sendo mesmo cruel, muito cruel. Quando sorri. O mundo também pára. Pára de chorar.

É o cúmulo pensar que dá para ser uma pessoa bonita fazendo plástica, indo em academia, usando creminhos, acertando na mega, puxando cartão de crédito daqui, distribuindo brilhante por ali, viajando pra cima e pra baixo, andando com carro da moda. Gente bonita não vem empacotada, não tem laçinho de fita, não é bolo de festa e nem sabe que é bonita. Sabe mesmo é fazer a sua parte e bem. Sabe defender o outro quando precisa, sabe berrar que o político é corrupto, sabe estender a mão quando a mão deve ser estendida, sabe dar para vizinha uma xícara de arroz, sabe o nome da vizinha e sabe rezar, porque ora-ação é sempre feita por gente bonita.

O mundo, a velocidade das coisas, a inversão dos ângulos, o campo de busca, o tráfego, tem nos deixado meio atônitos com tantos tipos de certezas que num instante após já se tornam incertezas. Mas, é fácil diferenciar uma pessoa bonita de uma beleza passageira. As pessoas bonitas ficam para sempre e não é no jornal, nas revistas de celebridades, nas colunas sociais, nos releases pós-pagos que triunfam. Elas habitam outro Olímpo, o Olímpo onde deuses e deusas são aqueles sem vendas nos sentimentos.

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