terça-feira, 21 de setembro de 2010

]pérolas[








A formação das pérolas se dá a partir do contato de algum material estranho que invade o seu organismo. O amor tem se dado assim dentro de nós.


Quando nos damos por conta aquele grão de areia se põe a nos incomodar. Um incomodar cheio de prazer. De bobagens que vão saindo pela boca como as mais verdadeiras declarações. Bobagens que nos tornam frágeis, vulneráveis, sedentos de uma bebida que só aquele outro, nenhum outro, saciará a nossa sede. Porque o prazer num corpo em solidão ao iniciar é o abismal.

Mesmo que a luz se apague aquela claridade vai ficando ali, mesmo que os olhos se entreguem para essa morte temporária que é o sono, o sonho mantém esse universo encantado ali. Mesmo que Descartes diga que não, o sentir vai se instalando ali.

A pérola vai se formando. Aquela riqueza que é construída de muita sutileza, de uma beleza visível e invisível, de portas que falam e de outras que se calam. Uma hortelã, um chocolate quente, um café e uma janta. Uma janta muito simples de verduras, um pão muito singular como o árabe, um beijo muito doce. Ainda não haveria de ter o sexo, só à forma mais primitiva de prazer que é proteger e se sentir protegido.

Não era necessário nenhum enfeite, porque se fazia no sorriso, no gracejo, no pequeno dedo que caminha sobre os lábios. Queremos tantas confissões. Quando as confissões nunca se abrandam. Ficam brincando como luzes de farol num fazer e desfazer. Deveríamos querer menos, assim quem sabe teríamos tempo para perceber mais. Angustia-me ver muito pouco com olhos tão perfeitos. Talvez seja uma angústia coletiva. Seja a tua também e dos outros que virão para nos suceder. É necessária urgentemente uma alfabetização para o olhar.

As pérolas de melhor qualidade encontram-se no Golfo Pérsico, na Índia e Sri Lanka, na Austrália e na América Central e as pérolas cultivadas são produzidas em larga escala no Japão. Mas desta pérola que falo, nasce quando o chocolate vai de uma boca até a outra, quando é possível que os cobertores caiam e mesmo assim o calor permaneça. Essa pérola que me refiro é a que se inscreve no corpo, nos corpos. Na felicidade que pode ser produzida em nós apenas produzindo felicidade no outro. Não requer mais explicação da pérola que me refiro, mas insisto que essa pérola não se torna cara pela sua qualidade, mas pelos enormes sacrifícios que são infligidos entre o caminho que há em se ir abandonando o medo para se viver à veracidade do contido.

A pérola pode ser usada em "poções" do amor e os séculos trarão para o presente o passado que estava dormindo. Porque nada na pérola ficará vulgar. A inocência protege a pureza e não é o que se faz que nos torna prosaicos, mas sim o agir sem natureza.

Creme, dourada, verde, azul e negra.

Nada mais naquela pele. Tudo naquela cor que se despreguiçava. Naquela mala que tantas vezes foi feita e desfeita. Naquele dia que namoraram e que mais uma vez namoraram e que quando pensavam ter cansado de namorar é que eles podiam ver o quanto suas pérolas se enamoravam.

A tarde ia derrubando gotas de orvalho nas costas das folhas. Tinha alguma canção. Minto, nesta altura eles eram a canção.

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