segunda-feira, 7 de junho de 2010

[insônia]



Essas noites que não se dorme. Essas noites que os lençóis pesam sobre o nosso corpo. Que se vira para um lado e para o outro. Essas noites que o assalto a geladeira é mais que inevitável, é um assédio. Essas noites que esquecemos que um dia o que nos tirava o sono mesmo era o passeio, o campeonato, as histórias de terror dos irmãos mais velhos, o barulho das folhas das árvores nas folhas de zinco.

Os fantasmas andam pela casa, os nossos fantasmas. Os nossos fantasmas que contam dos desamores, dos dissabores, do que não tinha, do que não vinha. Os fantasmas não fazem barulho, o que nos assombra é o silêncio. E o sono? Cadê o sono? O sono não dorme. Uma luz acesa. Poderia ser a do corredor ou a do banheiro. Era o que bastava para que os fantasmas ficassem iluminados. Uma canção, a sua voz. Um afago, suas mãos em nossos cabelos. Só a sua presença já bastava para iluminar os nossos fantasmas.

As horas que não passam. O sol que não chega. Na insônia o sol não chega. Só o escuro. Na insônia só o escuro é o tempo real. Quando brincávamos podíamos estar casados sem estarmos casados, podíamos fazer tortas e bolos sem termos fogões. Tínhamos cavalos dentro de nossos quartos e as espadas nada sabiam do morrer. Como conhecíamos com profundidade um tempo sem aquários. Nem sabíamos o que representava anos, meses, semanas, dias, horas, minutos e segundos.

O tempo é outro. Um tempo inquieto e os nossos olhos permanecem abertos. A mente teima em ficar triturando pedaços do dia que passou, da semana que passou, do ano que não passou. Bastava uma guerra de travesseiros não desejávamos mais dormir. Mas também bastava uma boa companhia para o sono se perder. Um bom filme e os olhos bem arregalados. Uma excitação desse outro poente. Da primeira ida para ver o mar. Do encontro com o que sempre escapou. Do beijo que não saiu e que se perdeu nas ruas.

O sono não chega, mas chegará. Ele não é de matéria infinita, ele é finito como nós mesmos. Basta uma esquina que lhe dê sentido e partirá por aquela calçada. Então viverá e virará algo para se rir. Porque quando podemos rir do que nos causa dor a dor adormece. Como aquela topada na calçada anos atrás, o braço quebrado quando criança, a vacina, a injeção, o dentista, a falta, a solidão, o frio, a piada sem graça. Por fim e é hora de acordar para uma nova manhã.

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